Táticas, finais, problemas e outros estudos de Xadrez
Ontem, 23 de maio, às 19:00 horas na ALEX, com a presença de Bráulio Santos Jr, José Mesquita, Roberto Stelling, Alexandre e este que lhes escreve, realizamos o Debate-Estudo sobre o Mate de Bispo e Cavalo.
Foi apresentada uma nomenclatura que utiliza apenas termos enxadrísticos no lugar da hipotenusa dos já consagrados mas não muito difundidos “triângulo menor”, “triângulo médio” e “triângulo maior”.
Assim, a “primeira diagonal” é a diagonal de casas da mesma cor que o bispo mais próxima da quina onde se dá o mate, correspondendo à hipotenusa do triângulo menor. A “segunda diagonal” é aquela da mesma cor por onde o bispo corre que é a segunda mais próxima da quina onde se dá o mate, correspondendo à hipotenusa do triângulo médio. E similarmente, a “terceira diagonal” corresponde à hipotenusa do triângulo maior.
Também foi apresentado o conceito de “barreira”, o qual não possui nada de novo mas apenas decorre das propriedades das diferentes peças quando em um final elementar. Uma “barreira” é uma disposição de peças ou de uma peça que impede o rei adversário atravessar uma região do tabuleiro. Assim, podem existir barreiras fechadas, que prendem o rei adversário em uma dada região, ou barreiras abertas, que podem ser contornadas pelo rei adversário.
A dama, por exemplo, sempre cria sozinha uma barreira fechada ao rei solitário, correndo até mesmo o risco de afogá-lo em uma quina do tabuleiro se porventura se posicionar a um salto de cavalo dessa quina. A torre também cria uma barreira fechada mas, como pode ser atacada diagonalmente pelo rei adversário, necessita de seu rei para que tal barreira seja fixa, ou seja, a torre não necessite se mover.
Um bispo ou um cavalo, sozinhos, nunca criam barreiras e exatamente por isso nenhuma dessas peças individualmente é capaz de, com o rei, desferir um mate elementar. Mas podem fazê-lo conjugando sua ação ou conjugando a ação de cada uma dessas peças com a de seu rei. Por exemplo, um bispo e um cavalo posicionados lado a lado em casas de mesma cor criam uma barreira de sete casas em forma de “escada” em cinco colunas ou filas (veja em um tabuleiro!).
Posicionados contiguamente em casas de uma diagonal, criam uma barreira de cinco casas em forma de “L” em quatro filas ou colunas (veja em um tabuleiro!)
Na maioria das vezes, uma barreira de bispo e cavalo é aberta se não há a ajuda do rei. A exceção é a barreira criada na segunda diagonal, que prende o rei na região próxima à quina do mate, a qual corresponde ao fechamento do triângulo médio.
Também com a ajuda do rei, um bispo e um cavalo criam uma barreira fechada na terceira diagonal, prendendo o rei adversário em uma ampla região na qual a quina do mate se situa, o que corresponde ao fechamento do triângulo maior.
O bispo e o rei ou o cavalo e o rei também criam uma barreira fechada na primeira diagonal, o que corresponde ao fechamento do triângulo menor.
Além disso, rei, bispo e cavalo, ou a ação conjugada de duas dessas peças criam barreiras que se fecham em uma borda do tabuleiro, embora sejam abertas na outra extremidade. O método de Phillidor, ou do “W” de cavalo é um exemplo onde esse tipo de barreira é utilizado, podendo até mesmo ser dito que esse método utiliza uma barreira ambulante.
Debateu-se então tanto o método dos triângulos como o método de Phillidor, ou do “W” de cavalo desde o ponto de vista das barreiras.
Debateu-se também os três tipos de mate de bispo e cavalo sob esse mesmo ponto de vista, bem como a conjugação dos dois métodos acima citados.
Finalmente, houve um interessante debate sobre como o ensino do mate de bispo e cavalo a um iniciante no Xadrez pode ser utilizado para se apresentar os fundamentos da estratégia enxadrista e do jogo de posição. De fato, por exemplo, no método de Phillidor, com o rei adversário no centro do tabuleiro, há claramente um plano estratégico de três etapas, a saber, empurrá-lo para a quina onde o mate não é possível, empurrá-lo dessa quina à outra com a barreira ambulante do W de cavalo e depois desfechar o mate.
Na condução desse plano estratégico, entretanto, o enxadrista deve estar atento à necessidade de modificá-lo se o adversário resolver recuar seu rei do centro para o lado “perigoso” do tabuleiro, ou próximo à quina do mate, tentando “driblar” o condutor do bispo e do cavalo. Nisso reside a importância de se conhecer o conceito de barreira da segunda diagonal, ou do fechamento do triângulo médio pois, no caso do adversário adotar essa contudo, o plano estratégico inicial deve mudar.
Da mesma forma, se durante a consecução da barreira ambulante do W de cavalo o adversário tenta fugir pelo centro, ao invés de obstinadamente tentar sempre retornar à quina onde o mate não ocorre, também há a necessidade de se mudar o plano estratégico, que passa a ser o da criação da barreira da segunda diagonal, ou do fechamento do triângulo médio.
Assim, ficou claro que o mate elementar de bispo e cavalo reúne todos os elementos para uma discussão em profundidade da estratégia do jogo de Xadrez e seu ensino nessa perspectiva pode ser muito mais interessante e proveitoso ao iniciante do que o mero ensino de uma técnica que dificilmente encontrará oportunidade de aplicação prática.
Nesta quinta feira, 23 de maio, às 19:30 horas faremos uma sessão de estudo e debate desse mate elementar. Será apresentado o Método das Barreiras que não possui nada de novo em relação ao Método dos Triângulos e ao Método do W de Cavalo mas pretende ser uma alternativa mais didático e de maior facilidade de memorização.
Se houve uma conclusão do recente Torneio do Mate de Bispo e Cavalo recentemente realizado pela Associação Leopoldinense de Xadrez – ALEX – esta é a seguinte: quem não estudar e treinar com seriedade este mate elementar não conseguirá executá-lo em uma partida de torneio, especialmente sob pressão de tempo. E isso irá acarretar o desperdício de precioso 1/2 ponto e, ainda pior, o pagamento de um grande mico.
A principal objeção contra o estudo desse mate elementar se baseia no fato de ser extremamente baixa a probabilidade dele ocorrer em uma partida de torneio. Na engenharia de risco, entretanto, o cálculo sempre é feito multiplicando a probabilidade de um evento pelo prejuízo que esse evento acarretaria. O risco, em decorrência, é sempre expresso em unidades monetárias. Aplicando essa teoria ao Xadrez de competição, se de fato é muito baixa a probabilidade de desse final acontecer, o mico que se paga no caso de um empate é muitíssimo alto. Multiplicando a probabilidade (pequena) pelo mico (grande), temos uma quantidade de mico alta demais para ser desprezada!
E o pior é que esse tipo de falha sempre ocorre nas piores situações possíveis. Não será em um torneio intercapivaral qualquer… Irá ocorrer na rodada decisiva de um torneio importante, no qual estávamos indo muito bem! A Lei de Murphy garante!
A penúltima comprovação prática desse raciocínio (pois nesse tipo de situação nunca há uma última vez…) foi vivenciada pela atual Campeã do Mundo, a Grande Mestra ucraniana Anna Ushenina que, no importante “Fondation Neva Grand Prix 2013” empatou uma partida pela regra dos 50 lances tendo a sua disposição um bispo e um cavalo para dar mate ao solitário rei da adversária! Daqui há muitos anos, Ushenina não será conhecida como “aquela enxadrista que foi Campeão do Mundo” mas como “aquela Campeã do Mundo que não conseguiu dar o mate de bispo e cavalo”…
Como afirmamos, não é trivial dar um mate de bispo e cavalo sob pressão de tempo. Além disso, o treinamento mais frequente, utilizando tablebases – tal como é possível fazer com uma assinatura Ouro de Chess Tempo, por exemplo – é muito enganoso pois estas sempre dão o lance que mais tempo leva até o mate e isso implica, muitas vezes, o recuo voluntário do rei solitário até a borda do tabuleiro mais próxima da quina de cor contrária ao bispo, o que facilita a tarefa do lado superior. Assim, nas partidas contra adversários humanos que procuram manter seu rei no centro ou movimentá-lo para o lado onde a dificuldade prática lhes parece maior, a etapa mais difícil é a de forçar o rei solitário até uma borda.
Nessa etapa (mas não somente nela), é necessário saber formar barreiras ao rei adversário, coordenando as ações do bispo, do cavalo e do rei. Dessa forma, o estudo e treinamento sério desse mate elementar pode trazer benefícios muito maiores do que o simples domínio da técnica.
De fato, além da certeza do mate na possibilidade desse final aparecer no tabuleiro, há mais benefícios no treinamento de como se empurra o rei solitário do centro para uma borda e, uma vez na borda, se necessário, de como arrastá-lo de um canto do tabuleiro para o outro, para não falar do treinamento nos mecanismos finais de mate.
Um dos benefícios é o aumento da capacidade de se visualizar vários lances à frente em um tabuleiro vazio, já que a visualização é sempre muito útil nos finais em geral. Outro benefício é a formação do reconhecimento cognitivo dos padrões de ação combinada de um bispo e um cavalo no estabelecimento de *barreiras* para o rei adversário, o que pode ser muito útil no meio jogo, por exemplo, em uma rede de mate.
Na sexta-feira dia 10 de maio, realizamos na ALEX o Torneio do Mate de Bispo e Cavalo. Tivemos 5 participantes e a classificação final foi a seguinte:
1º – Álvaro Frota – 7 pontos
2º – Francesco Noseda – 6 pontos
3º – José Blanco – 3 pontos
4º e 5º – Flávio Quintela e Ellen Giese – 2 pontos
O emparceiramento do torneio foi o de todos contra todos, com turno e returno, ficando um dos participantes de bye em cada rodada.
Visto que o objetivo das partidas era dar mate no adversário, convencionou-se que os empates pela regra dos cinquenta lances, afogamento ou perda de peça seriam computados como zero ponto para o branco e 1 ponto para o negro.
A regra dos cinquenta lances foi controlada através de uma função do relógio digital DGC que permite a fácil visualização do número de lances decorridos até o momento. Para facilitar, ficou convencionado que o número de lances seria verificado após o mate e se fosse igual ou maior que 50, a partida seria declarada empatada, com o ponto sendo atribuído ao negro.
O ritmo das partidas foi de 3 minutos + 2 segundos de bônus por lance e, como normalmente, a perda por tempo acarretava a perda do ponto.
Antes das cinco primeiras rodadas, foi sorteada a posição a partida da qual o branco iniciaria a partida. Nas cinco rodadas do returno, a mesma posição foi jogada, invertendo-se as cores.
Os resultados indicam que não é trivial dar mate de bispo e cavalo sob pressão de tempo. O treinamento com tablebases é parcial pois estas sempre dão os lances que mais tempo levam até o mate e isso implica, muitas vezes, o recuo do rei negro até uma borda do tabuleiro. Nas partidas, assim, a etapa mais difícil e que acarretou vários empates (ficando o negro com o ponto) ou perdas por tempo foi a de forçar o rei até a borda.
Outra conclusão importante que decorre desta é que os participantes tiveram dificuldades de coordenar a ação do bispo com o cavalo e que, dessa forma, o treinamento desse mate pode trazer benefícios muito maiores do que o simples domínio dessa técnica de final.
Depois que a Campeã do Mundo, Grande Mestra Anna Ushemenina empatou a partida pela regra dos 50 lances tendo a sua disposição um bispo e um cavalo para dar mate ao rei sozinho da adversária, a Associação Leopoldinense de Xadrez, preocupada em evitar que seus associados paguem mico em eventuais campeonatos mundiais que venham a disputar no futuro, resolveu lançar mão de uma forma lúdica para a aprendizagem e treinamento dessa classe de mate elementar: o Torneio do Mate de Bispo e Cavalo.
Objetivo: Congraçar os alexanos, treinar o referido mate e garantir o não pagamento de micos em eventuais futuros campeonatos mundiais.
Data: Sexta feira próxima, dia 10 de maio, 19:30 horas;
Partidas: As partidas começarão em posições sorteadas de mate de bispo e cavalo. O sorteio será feito antes de cada rodada.
Emparceiramento: Será um torneio em dupla volta, de forma a que um adversário sempre enfrente o outro uma vez com o bispo e o cavalo e outra vez só com o rei.
Controle de tempo: 3 minutos para cada jogador mais 3 segundos de bônus por lance para cada jogada
Regra dos 50 lances: serão utilizados modernos relógios digitais que contam os lances, possibilitando a aplicação da referida regra. Cada jogador poderá, apenas e tão somente em seu próprio tempo e em apenas e tão somente em até três ocasiões durante a partida, verificar o número de lances já jogados e, em consequência, a aplicação ou não da citada regra.
Inscrição: Grátis
Prêmio: A satisfação de poder dar mate no adversário na próxima vez que tal posição se configurar no tabuleiro.
Baixe a partida em PGN.
Abaixo reproduzo interessante posição atingida na partida entre Ellen e Álvaro. O branco joga. Façam criteriosa análise para avaliar se poderia haver outra continuidade neste jogo. Não vale Engine!
A primeira vista as brancas devem se contentar com tablas!! Na análise post-mortem se cogitou do sacrifício da outra torre branca (Th1) para se obter ataque direto ao rei negro. Foi uma boa ideia sem, contudo, ser acompanhada de uma sequência plausível.
Infelizmente, ninguém conseguiu ver uma manobra sutil de ameaça de mate seguido de caça à dama preta, demonstrando, assim, que a sequência do negro não foi a melhor.
Com essa ajuda, agora, as coisas ficaram fáceis.
A melhor sequência parece ser: 18. Dd2… com a idéia de Dd2-g5… e ameaça de mate. Esse é o lance tranquilo que fica oculto na posição!!
Nesse ponto parece forçado o defensivo 18… f6, pois, se 18… Ba6, seguiria, 19. Ch3!! Dxh1 (forçado) 20. Dg5… e o branco ganha.
No entanto, depois de 18…. f6 o branco tem 19. Bd3… forçando 19… Da2 e depois de 20. Ce2 o branco ganha pois a dama negra está condenada!
Quando esse assunto se iniciou com a postagem do Blanco no site da ALEX, eu enviei um e-mail para nossa lista interna do clube, fazendo, com as palavras, a mesma “cara de mau” que eu fizera na partida.
O objetivo foi apenas e tão somente criar clima. Agora que o assunto foi resolvido, peço a todos: por favor, não fiquem achando que eu seria uma pessoa tão arrogante e intragável quanto aquele e-mail fez questão de deixar claro que eu seria. Quer dizer, compreendo perfeitamente que sou arrogante e intragável mas não no nível daquele e-mail…
Enviei aquele e-mail por que estou lendo o livro “Las Jugadas Invisibles em Ajedrez” e avalio que minha partida contra a Ellen é um bom exemplo do que os autores desse livro (Yochanan Afek e Emmanuel Neiman) chamam de invisibilidade psicológica.
Explico-me. Em uma dada posição mais ou menos complicada, o enxadrista só vê aquilo que seu conceito do adversário lhe permite ver. Só vê derrota contra um adversário que julga muito mais forte ou só vê vitória contra quem julga muito mais fraco. Então, quem comprou o discurso de homem mau que eu costumo vender (e pelo menos um enxadrista de nosso clube que aceitou o empate na lista da ALEX eu tenho certeza de que comprou, os demais não me meto a dar opinião) não conseguiu ver na posição da partida mais do que um empate, pois tal resultado contra o homem mau já lhe seria plenamente satisfatório.
O mesmo vale para a situação da Ellen quando da partida. Embora ela jure que não seja o caso, essa foi a primeira coisa que eu expressei na análise post-mortem (perguntei se ela não tinha visto que eu estava completamente perdido!) e insisto nesse tema em prol do avanço enxadrístico de nossa companheira de clube!
Como sempre acontece nesses casos de homem mau quando a partida foi analisada pelo GM Houdini, um grito se ouviu: – O homem mau … morreu!
Devo confessar que na partida, diante do tabuleiro, depois de ter sacrificado o cavalo e antes de tomar a torre da Ellen, mais precisamente depois que ela jogou 14. Rf2… eu tomei um “susto” danado pois percebi que o sacrifício era completamente furado e eu já estava completamente perdido, já que na posição resultante depois da tomada da torre em “a1” minha dama ficaria presa em um canto e meu rei ficaria totalmente sem peças para se proteger no outro. Então, tinha que ter algum modo de se aproveitar das duas situações para, ou dar mate, ou ganhar a dama.
Minha alternativa ali diante do tabuleiro seria reconhecer que o sacrifício de cavalo tinha sido furado e não tomar a torre. Mas, se fizesse isso, a Ellen converteria em ponto a vantagem material sem maiores problemas. Então essa não era uma alternativa. Por outro lado, eu tinha prestado atenção suficiente na reação dela diante do sacrifício do cavalo em “d5” e tinha percebido que ela não estava esperando aquilo. Então, a minha melhor chance prática era passar o óleo de peroba na face e continuar…. Daí eu dei o xeque em “d4” fazendo pose de que estava tudo dominado.
E, de fato, estava tudo dominado… Só que não exatamente para o meu lado!!
Assim, em meu modo de ver, as principais lições dessa partida são:
1.) É preciso prestar atenção não apenas no tabuleiro mas também nas reações do adversário. Xadrez é uma luta entre duas pessoas por intermédio de um tabuleiro e um conjunto de peças, de forma que as posições geradas no tabuleiro são apenas uma parte do que realmente está ocorrendo na partida. A outra parte, tão importante quanto, é o que está passando na mente dos dois adversários. Daí a necessidade de se prestar a devida atenção à linguagem corporal do outro e, também, a de praticar o assim chamado poker face, ou seja, não deixar que o adversário leia as manifestações de nossa linguagem corporal.
2.) É preciso treinar o reconhecimento cognitivo de posições. Por isso é que eu insisto tanto em apresentar o Chess Tempo. (Eu deveria isto sim é treinar no Chess Tempo mas isso eu acabo não fazendo…) Em uma posição tal como a da partida, com a dama presa de um lado e o rei desprotegido de outro, se você tem um par de bispos apontados tanto para a dama como para o rei, a posição no tabuleiro tem que fazer soar o alarme dentro da mente:
3.) Trate de analisar, sabendo que na posição há um ganho forçado em algum lugar!
Hoje em dia ficamos maravilhados das “magias” de Carlsen e Aronian que vencem posições onde as tablas pareciam inevitáveis.
Convido os leitores alexanos de todas as forças de jogo a encontrarem (sem engines, por favor!) os planos de jogo vencedores que titãs do xadrez soviético, Botvinnik e Averbakh descobriram nos finais mais empatativos que existem: o de bispos de cores opostas.
A crescente participação em torneios internacionais fez com que Keres se desviasse de sua atividade de composição de problemas, que se caracterizam por posições artificiais, e tomasse gosto pela composição de estudos por esta ser mais próxima da prática do jogo. De trinta estudos compostos por ele, muitos mereceram prêmios e distinções. O maior êxito de Keres nesse âmbito foi o terceiro lugar na Seção de Estudos do Primeiro Campeonato de Composição da URSS (1947). A análise desse estudo trouxe uma contribuição à teoria de finais de torre.
Nas duas composições seguintes, as pretas levam mate quando sua posição parecia estar segura…
DIAGRAMA 6
As brancas jogam e ganham
DIAGRAMA 7
As brancas jogam e ganham
DIAGRAMA 8
As brancas jogam e ganham
Publicado numa revista de xadrez húngara em 1936, esse estudo causou uma forte impressão.
DIAGRAMA 9
As brancas jogam e ganham
Diagrama 6
Os dois cavalos estão atacados, e segue 1. Cb3! Rxc4 2. Cd2+ Rc3 (único) 3. Cxe4+ Rb3 4. Bc1! Rxa4 5. Rc7 Ca6+ 6. Rb6 Cb4 (6. … Cb8 7. Rf6 e 8. Rb7) 7. Cc5#!
Outro lance de cavalo, 1. Cf3, não serve devido a 1. … Bxf3 2. Ce5+ Rc3 3. Cxf3 Rb3, e o mate não acontece, pois o cavalo branco não consegue atingir c5.
Diagrama 7
1. Cb4 a2 (se 1. Bf8 então 2. Rb5 Bxb4 3. Rxb4 Rxc2 4. Rc6 a2 5. Cb4+ e 6. Cb3, mantendo o peão e ganhando) 2. Cxa2 Rxc2 3. Ba5!! O único lance que conduz a ganho! No caso de outra retirada do bispo, seguiria 3. … Bd2 com empate.
3. … Rb3
E agora por que não 3. … Bd2? Porque então 4. Cb4+ Rb3 5. Rb5.
4. Cb4 Ra4 5. Cb7!!
Esse é o único jeito. Se o bispo for defendido pelo rei: 5. Rb6, então 5. … Be3+ 6. Ra6 Bd2 7. Cdc6 Be1 8. Rb6 Bf2+ 9. Rc7 Be1!, leva ao empate, pois, se 10. Rd6, as pretas jogam 10. … Rb5!
5. … Bd2
Diagrama 8
Pode parecer que as pretas se salvam. Como as brancas podem defender a peça? Se 6. Rc5, então 6. … Be1! 7. Rc4 Bxb4 8. Bxb4 com afogamento. Porém, à disposição das brancas, existe uma ideia original de mate.
6. Cc2!! Bxa5 7. Cc5#.
Publicado numa revista de xadrez húngara em 1936, esse estudo causou uma forte impressão.
Diagrama 9
A ameaça é 1. … b2+, e o lance 1. Db8 não serve. Entretanto após o lance introdutório 1. Cc2+!! Bxc2, a continuação 2. Db8 decide, pois, se 2. … b2+, as brancas tomam o bispo. Ao mesmo resultado conduz 2. … Bb1 3. Bxb3 Ba2 4. Dxc3#.
Resta afastar o rei: 1. … Ra2. Então 2. Cb4+ Ra1.
É muito interessante a variante 2. … Ra3 3. Cd3! Bxd3 4. Dd6+ Ra2 (de outra forma simplesmente 5. Dxd3), e agora 5. Dd5!!, cravando o peão b3 e ameaçando 6. Da5#.
Traduzido por Fernando Madeu
Neyshtadt, Yakov Isayevitch. Keres i Shakhmatnaya Compozitsiya (In: ______. Shakhmatnaya Universityeta Paulya Keresa. Moscou: Fizcultura i Sport, 1982, p. 219-221.)
17/02/2013
A proposta desta coluna é apresentar conteúdos variados relacionados ao xadrez. Sem abdicar de material “técnico” (análise de partidas, problemas, estudos, finais, regras, arbitragem, etc) e outros tais como ensino de xadrez, buscamos abordar algum aspecto de interesse histórico, biográfico ou, se não original, pelo menos incomum ou pitoresco.
Texto nº 1
A escolha do primeiro texto decorre dessa proposição, já que trata de uma faceta pouco conhecida do Grande Mestre soviético Paul Petróvitch Keres (1916 – 1975), nascido na cidade de Narva (Estônia).
Keres era tido como um dos maiores não campeões do mundo e infelizmente não teve oportunidade de disputar o título com Alekhine num possível “match” que se negociava após sua vitória no famoso torneio A.V.R.O. (Radiodifusão Holandesa), em 1938, devido à irrupção da Segunda Guerra Mundial no ano seguinte.
Naquela competição superou nada menos que os campeões mundiais Botvinnik, Alekhine, Capablanca e Euwe!
Keres esteve no Brasil em 1973, para participar do primeiro torneio Interzonal realizado em nosso país.
Faleceu em 1975, poucos dias depois de disputar o Torneio de Vancouver (Canadá).
O texto que apresentamos a seguir foi traduzido de um capítulo do livro de Yakov Neyshtadt sobre a carreira de Keres, publicado em russo, garimpado da biblioteca da ALEX.
Neyshtadt, Yakov Isayevitch. Keres i Shakhmatnaya Compozitsiya (In: ______. Shakhmatnaya Universityeta Paulya Keresa. Moscou: Fizcultura i Sport, 1982, p. 219-221.)
Tradução do russo: Fernando Madeu
Keres e a composição enxadrística
O talento enxadrístico multifacetado de Keres manifestou-se não apenas no jogo prático e na análise. Já nos tempos de escola, o futuro Grande Mestre se entusiasmara pela composição de problemas. Quando Paul tinha treze anos, teve um de seus problemas de mate em dois publicado na imprensa estoniana.
Ao todo Keres publicou mais de cento e setenta problemas, principalmente de mate em dois lances.
DIAGRAMA 1
Mate em dois lances
DIAGRAMA 2
Mate em dois lances
DIAGRAMA 3
Mate em dois lances
DIAGRAMA 4
Mate em dois lances
DIAGRAMA 5
Mate em dois lances
Respostas na próxima semana…
resposta diagrama 1
O tema é o da “rosácea do cavalo”. O lance 1. Bg2 cria a ameaça 2. Cf3#. Nenhuma das oito jogadas com o cavalo evita o mate.
O problema ganhou o primeiro prêmio em um concurso norueguês (1933).
resposta diagrama 2
Jogando 1. Ce6 com ameaça de 2. Cd4#, as brancas concedem ao rei preto duas casas de fuga. Se 1. … Be5 2. Cdf4#, ou 1. … Bb6 2. Cc3#.
Esse problema foi agraciado com o primeiro prêmio em um concurso sueco (1935).
resposta diagrama 3
1. Cd4! ameaça 2. Td7#. Se 1. … Bxd4 seguiria 2. Dxb3#; e no caso de 1. … Txd4 2. Cc3#. Outras defesas não ajudariam: 1. … Bf6 2. Bxf7#; 1. … Tf6 2. Te5#.
resposta diagrama 4
1. Cd3! (ameaçando 2. De6 e simultaneamente liberando a grande diagonal). Se 1. … Te3 2. Cf3#; se 1. … Cc5 2. Cc6#; no caso de 1. … Bf7 2. Ce6#.
resposta diagrama 5
Após 1. C3h2! (com a ameaça de 2. Cg4#), as brancas, defendendo-se de qualquer mate de dama, anunciam mate: 1. … Db7+ 2. e4#; 1. … Dc6+ 2. Be4#; 1. … Da8+ 2. d5#.
por Fernando Madeu
Professor de xadrez da Escola Municipal Affonso Penna (Rio de Janeiro, RJ)
Árbitro de xadrez da FEXERJ e CBX
Pesquisador de conteúdo em mídia e educação (MultiRio – Empresa Municipal de Multimeios – Rio de Janeiro, RJ)
Professor de Língua Portuguesa – SEE-RJ
José Eduardo Maia
Este é um artigo voltado para os Alexanos iniciantes ou os da classe C e B. Mas os mais fortes estão convidados a colaborarem com sugestões, discordâncias, etc. É o primeiro de uma série, a convite do Presidente Blanco, sem uma ordenação temática, mas uma miscelânea de assuntos sob minha perspectiva.
O tema esta semana é sobre a questão da capacidade do enxadrista de visualizar mentalmente (ou seja, sem olhar o tabuleiro) posições e lances, dominando toda geometria que envolve o jogo.
Esse tema começou a me chamar a atenção quando em um ping no Posto 6 em Copacabana eu vi um classe A da FEXERJ exibir orgulhosamente um “tijolão” de mais de 500 páginas contendo combinações em todos os seus temas. Pensei: “legal, é uma forma de treino”. Contudo, tive a feliz ideia de perguntar a ele: “ei, olha para mim. Qual a cor da casa f5?” o cara não respondeu! Perguntei sobre cores de outras casas, casas que formavam uma diagonal,etc, NECA!
O caso do meu querido amigo classe A é que ele teve uma lacuna logo em seu aprendizado do jogo. Assim como eu tive e muitos outros.
É aconselhável a qualquer iniciante ou estudante aprender sobre o tabuleiro de xadrez e toda a sua geometria (em caso de crianças muito pequenas isso pode ser uma exceção devido à cognição pouco abstrata) concomitantemente aos movimentos das peças. O melhor método que já vi até hoje nesse sentido é o que consta no livro Comprehensive Chess Course, vol. I,II de Lev Alburt e Roman Peltz . Esses livros são extraordinários e recomendo fortemente a todo classe C com severas dificuldades de visualização que reaprenda com eles o elementar de xadrez, fazendo mentalmente os exercícios propostos como um aquecimento cerebral prévio a outros treinos/estudos.
Então, todo estudante deve aprender bem sobre o tabuleiro de xadrez de forma que seja capaz de “vê-lo” em sua mente. Deve ser capaz de responder rapidamente, sem olhar o tabuleiro, a questões como: como um cavalo vai de c4 a f6, passando por d3? Quais as casas onde um bispo em h4 pode atacar uma dama em d6? Quais as diagonais que fazem interseção com a casa c5? Qual a casa que faz a interseção da diagonal b1-h7 com a quarta fila? E por aí vai.
Ao fim de um rigoroso treinamento de visualização do tabuleiro, o estudante deverá estar apto a reproduzir mentalmente partidas somente olhando os lances. Também deverá estar apto a depois de olhar um diagrama de combinação por 2-3 minutos, resolvê-lo mentalmente.
O tipo de treinamento citado deveria ser empregado seriamente por jogadores de todas as forças (adequando os treinos para cada gradação de força, claro).
Evolução no xadrez é passo a passo. Não adianta fazer um treino de cálculo (em livro do Dvoretsky, por exemplo) se houver lacuna em visualização do tabuleiro. Treinar a capacidade de ver o tabuleiro em sua mente é de grande importância para seu futuro desenvolvimento.
Embora o pensamento posicional seja extremamente importante (na verdade, uma condição prévia ao cálculo, afinal como você terá condições de avaliar uma posição depois de “n” lances?), análises (cálculo) precisas é tão ou mais importante. Na prática, em uma partida, o enxadrista lida com muitas situações onde o concreto cálculo de variantes é necessário. Nestas situações, onde você necessita calcular muitas variantes , a capacidade de mentalizar as posições resultantes é de primeira importância e isto pode ser melhorado muito com o treino de visualização de tabuleiro. E as bem conhecidas capivaradas e lamentações (“eu tava ganho!” “eu tava melhor!”) irão drasticamente diminuir.
Bom, vamos aplicar agora um teste básico para os alexanos iniciantes, C e B (os mais fortes podem fazer também!). São dois pequenos testes que deverão ser feitos sem olhar um tabuleiro. Anotem suas soluções e depois sim chequem os resultados no tabuleiro.
1- Qual a cor da casa f6?
2- Qual a cor da casa b4?
3- Como um bispo em f5 pode ir para d6?
4- Diga todas as rotas mais curtas que um cavalo pode ir de e4 para h8.
Se você acertou 100% (sem muita demora) pode fazer o próximo teste básico. Se não acertou, vá correndo reaprender o jogo nos dois volumes do Comprehensive Chess Course e exercite também nesta página da internet
1- Brancas: Rh1, De4, Cf8, b2, e5, g2 e h2; Pretas: Rh8, De3, Bc1, a4, b4, g7, h6. Brancas jogam. Qual lance devem fazer?
2- Posição inicial. Depois de 1-e4-c6; 2-d4-d5; 3-Cc3-dxe4; 4-Cxe4-Cd7; 5-De2-Cgf6. Qual o melhor lance para as brancas agora?
3- Brancas: Rg1, Da3, Td1, Bg5, Ce2, a2, b3, c4, f2, g2, h2. Pretas: Rg8, Dg6, Tf8, Bb7, Ce5, a7, b6, c7, f7, g7, h7. Brancas jogam. O que devem jogar?
4- Brancas: Rg1, Bg2, Ce4. Pretas: Re3, Db2. Pretas jogam. Podem ganhar? Como?
Se você não acertou 100% do teste B, está num nível intermediário de visualização do tabuleiro e deve começar um treinamento no volume 2 do Comprehensive Chess Course, exercícios por mim enviados ou nessa página da internet.
Se respondeu a 100% corretamente o teste B, você tem uma boa capacidade de visualização e deve continuar melhorando essa habilidade com exercícios específicos, tais como:
Agora um desafio: em quantas rotas diferentes um cavalo vai de d6 a f4 no menor nº de lances?
Bom, fico por aqui nessa 1ª coluna. Dúvidas e críticas (por favor, muitas!), escrever para joseeduardomaia@terra.com.br
Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 2013.
Por Leo Mano
A posição do diagrama acima foi alcançada em uma partida que respeitou todas as regras do jogo de xadrez. Trata-se, portanto, de uma posição legal. Contudo, houve um esbarrão e o Rei branco rolou para fora do tabuleiro (enquanto todas as demais peças vistas no diagrama permaneceram em suas casas).
Em qual casa estava o rei branco?
Resposta na quarta-feira de cinzas :”(
Tentativa de Bráulio Santos:
On Thu, Feb 14, 2013, at 04:31 AM, bsantos escreveu:
Nenhuma resposta até o momento? Como o Leo ainda não postou a resposta, dou o meu palpite.
Na verdade, a posição é tão difícil de ser obtida que facilita a resolução do problema. A única possibilidade legal de onde poderia surgir a posição seria com o rei branco em b3 um peão branco em c2 e um peão preto em b4. As brancas cobrem o xeque de bispo com o lance 1.c2-c4…, as negras tomam en passant 1…b4xc3 e as brancas retomam o peão com o rei. 2. Rxc3…Portanto, o rei branco estava em c3 quando nele esbarraram.
Abs,
Bráulio.
Resposta por Leo Mano:
Corretíssimo!!
Leo
Na partida entre Pentala Harikrishna e Loek Van Wel, 5ª rodada do torneio Tata Steel 2013 chegou-se à seguinte posição:
O negro está com o rei exposto e acabou de jogar …Rg8-h7. O branco tem um lance muito forte. Qual é? (resposta abaixo)
1. Dxg6!! Cxg6 (Se 1…Rxg6 Be4#) 2. Tf7+ Rg8 3. Tg7#